A presença da Ronda Escolar em unidades de ensino tem sido motivo de vigilância constante por parte de facções criminosas na Bahia. Em áreas controladas pelo Comando Vermelho (CV) , gestores relatam que sempre que uma ronda policial chega ao pátio da escola, um telefonema de criminosos é recebido com o questionamento: "Qual foi o caso aí, professor? O que está acontecendo?" .
De acordo com educadores, a resposta precisa ser cautelosa, explicando que se trata apenas de uma visita de rotina para evitar represálias ou mal-entendidos. Embora não estejam fisicamente dentro das instituições, os líderes do crime organizado vigiam de perto qualquer movimento de forças de segurança.
Além disso, há relatos de que as facções têm influência direta na disciplina dos alunos , impondo "tribunais do crime" para julgar estudantes que se envolvem em brigas ou desentendimentos dentro das escolas. O recebimento da comunidade escolar em lidar com essa interferência tem tornado o ambiente educacional ainda mais desafiador.
“A visita da Ronda na escola não é muito agradável por parte do pessoal das facções porque eles não gostam de polícia no bairro. No entanto, é lógico que a polícia tem que vir. [...] Por não gostarem, até fazem um tribunal. Recentemente, duas alunas se envolveram em uma briga que uma das duas feriu a outra. Desceram as duas com as mães para o tribunal do crime para explicar. Lá, decidiram que a menina que bateu na outra ia pagar os medicamentos”, explica o gestor, que não se identifica por medo de represálias, destacando que o CV faz de tudo para não chamar a atenção da PM.
Por conta do relato, a reportagem procurou a Ronda Escolar em três momentos diferentes para ouvir uma fonte da Polícia Militar que pudesse falar sobre a ação do CV contra a unidade, mas não recebeu retorno. Em áreas do Bonde do Maluco (BDM), o olhar vigilante do tráfico não é diferente. Um policial que atua na região do Subúrbio Ferroviário de Salvador conta que, quando o assunto é a comunicação com gestores, tudo acontece pelas redes sociais para preservar a segurança dos educadores.
“Tem muito professor que prefere não ser visto conversando com a polícia na rua. Eu converso com um que só fala comigo pelo aplicativo de mensagens. Não quer ser visto com a gente para não levantar suspeita e nem aumentar a pressão que já existe na escola dele, que está dentro de uma área onde só há o BDM”, fala o PM, que terá nome e o cargo preservado. Uma diretora ouvida pela reportagem explica que, na região do Subúrbio onde há domínio do BDM, existe uma postura de evitar ocorrências que aproximem a polícia do bairro, mas estudantes já envolvidos complicam a situação.
“Veja, as facções não querem nada que chame a atenção, seja nas ruas ou aqui dentro das escolas. No entanto, isso é uma visão das lideranças que têm o que a gente pode chamar estratégia. Agora, os jovens que acabam se envolvendo com o tráfico e ainda estão aqui, que o pessoal costuma chamar de ‘empolgados’, se envolvem em brigas porque querem exercer um poder sobre os outros alunos através de intimidação. Eles, pelo menos, não duram muito tempo aqui depois de entrarem para o crime. Se ficassem, ia ser ainda pior”, aponta a diretora, que pede para não ser identificada.
O primeiro gestor ouvido pela reportagem indica o mesmo problema. Segundo eles, os jovens que são cooptados pelo tráfico, sempre largam a escola, já que não conseguem lidar com o paralelo de estar na escola e ser um integrante de facção. Nestes casos, meninos e meninas de apenas 14 anos até vão para a escola no começo, mas não conseguem ficar para todas as aulas.
“Nós perdemos agora em janeiro três alunos que estavam vindo esporadicamente na escola, se envolveram para ser um soldado, um olheiro, um avião ou outra coisa e acabaram morrendo. Eles ficam envaidecidos pelas coisas que o tráfico oferta. Meninos de 14 anos que são muito pobres, dependem de auxílio para sobreviver são facilmente atraídos pelo dinheiro e o poder que o tráfico supostamente coloca nas mãos deles”, afirma o diretor.
As informações são do Correio