Segurança Violência
Número de mortes em ação policial cresce 46% em 2023 na Bahia
Com Gabriel de 10 anos atingido por bala perdida em Portão, registro de crianças vítimas da violência armada dobrou
25/07/2023 08h56
Por: Redação Fonte: Correio da Bahia
Gabriel foi atingido por um tiro durante ação policial em Portão. Crédito: Reprodução

O Instituto Fogo Cruzado mapeou 244 pessoas mortas em ações policiais em Salvador e Região Metropolitana (RMS) de 1º de janeiro a 23 de julho deste ano. O número é 46% maior que os registros do segundo semestre de 2022 (167), quando o instituto passou a divulgar os dados da violência na região.

Vítimas de bala perdida foram 35 pessoas só em 2023, sendo 13 mortos e 22 feridos. A 13ª vítima foi Gabriel Silva da Conceição Júnior, 10 anos, no bairro de Portão, em Lauro de Freitas, atingido quando estava sentado na frente de casa, no último domingo (23). Ele morreu horas após o ocorrido.

No segundo semestre do ano passado, 21 pessoas foram vítimas de bala perdida, sendo 8 mortos e 13 feridos, o que mostra aumento na quantidade e na letalidade. Há 12 dias, outra vítima foi a jovem Camila Silva dos Santos, 23 anos, surpreendida por um tiroteio entre traficantes na região da Garibaldi, quando voltava para casa. 

Em coletiva de imprensa nessa segunda-feira (24), o governador Jerônimo Rodrigues foi questionado sobre os números da violência e afirmou que está criando um plano de trabalho para a segurança pública. Ele ainda que o caso do menino Gabriel será apurado.

Desde o início de 2023, o registro de crianças vitimadas pela violência armada também cresceu, de acordo com o Fogo Cruzado. Enquanto no segundo semestre de 2022, quatro foram feridas por disparos, neste ano esse número já chegou a oito. 

A Polícia Militar da Bahia emitiu nota de pesar sobre o falecimento de Gabriel Silva, garantindo que os agentes envolvidos na ação que vitimou o menino estão à disposição da Polícia Civil, responsável pela investigação do caso, bem com o armamento utilizado por eles.

De acordo com familiares do menino, PMs entraram atirando na Avenida Costa, onde fica a casa da família da vítima. Selma Santana, 51, avó de Gabriel, questionou a nota e pediu respostas concretas sobre o porquê dos PMs entrarem atirando em uma rua que, segundo ela, não tinha suspeito em confronto ou fugindo das guarnições.

"Estava comentando que as respostas que eles dão são todas de 'copia e cola'. Toda vez que acontece algo eles dizem o mesmo e a gente está cansado. Eles acham que, por se posicionarem de maneira firme, a gente vai aceitar. Mas não vai ficar assim, quem fez tem de ser responsabilizado e vamos buscar por justiça", garante.

Gabriel era filho único do pai, que foi internado após passar mal ao saber do falecimento do filho. A mãe da vítima tem um caçula de 1 ano e cinco meses. O corpo de Gabriel foi sepultado na tarde de segunda-feira, no Cemitério de Portão.

Polícia baiana é a mais letal do país

Segundo o Anuário Brasileiro da Segurança Pública, com base em dados de 2022, a polícia baiana é a que mais mata no país. Foram, em 2022, 1.464 mortes decorrentes de intervenção policial, dentro e fora de serviço. Dessas, 1.384 pessoas foram mortas por policiais militares e 80 por policiais civis. Esse número corresponde a mais de 20% das mortes registradas no estado no ano passado e ultrapassam os dados registrados no Rio de Janeiro, antes líder em letalidade em ações policiais.

A tendência é que o cenário não mude. Isso porque, de acordo com o Instituto Fogo Cruzado, 69% dos mortos na Grande Salvador neste primeiro semestre de 2023 foram atingidos em operações policiais. No Rio, a proporção foi de 47%.

Diretora-executiva do Fogo Cruzado, Cecília Olliveira, ressalta a importância da comparação. “Chamamos atenção desde o início do nosso trabalho para a alta proporção de tiroteios em ações policiais e para a quantidade de vítimas nessas situações, com destaques para chacinas e perseguições. Já tínhamos o parâmetro dos dados do Rio que apontam para uma situação muito grave", afirma.

Os dados mostram também que a letalidade policial não se espalha pela região metropolitana de maneira uniforme. Em um ano de mapeamento em Salvador e região metropolitana, o Fogo Cruzado constatou que 24 bairros de salvador concentraram 56% dos tiroteios em ações policiais. Destes, todos têm maioria da população residente negra.

"Nossos dados corroboram os dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. A polícia baiana precisa rever seus protocolos. E o estado precisa pensar em novos projetos de segurança que promovam a segurança de fato do conjunto da população sem colocar as pessoas na linha de tiro”, reforça Cecília.